O frio que faz lá fora, congela-me o pensamento. Congela-me a alma. Faz-me viver a minha vida em dois mundos completamente diferentes. Acabo de perder a chave para ambos. Julgava-me detentor de muita coisa, pensei eu, que, afinal era o líder de todos estes demónios e monstros que habitavam na minha cela. Viraram-se contra mim, virou-se tudo contra mim, perdi o poder das palavras e ganhei as sensações horrendas de todas as minhas creações. Uniram-se comigo e começam por alimentar-se da minha alma, criando uma barreira à volta da minha caixa de sentimentos perdida algures no meio de um corpo torturado, com marcas evidentes de batalhas, memórias e guerras perdidas. Enfrento tudo.. Enfrento todos esses demónios, todos os monstros, enfrento aquilo que criei com os actos mais inconscientes que alguma vez pude tomar. Não sei se poderei vencer.. São tantos, tantos.. Tantos! Os meus olhos alcançam interiormente esse horizonte que só fica preenchido com o rosto enrraivecido de cada um deles a caminhar na minha direcção com passos largos. Continua a fazer frio lá fora.. E a cada segundo que passa, rodo ao máximo a minha cabeça em todas as direcções, sem mexer o corpo na esperança que alguém surga e que se junte a mim, nesta festa de sentimentos podres. Mas.. Não surge uma alma.. Mantenho-me firme, fixo, enrraizado, unido com o chão que vou ter que pisar. À media que eles descem o vale gigantesco, o céu fica cada vez mais negro.. Só os olhos deles reluzem.. Vejo dezenas de olhos, centenas de olhos, mil olhos e eu desesperadamente, não paro de tentar avistar os dois caminhos que conduzem a dois mundos diferentes, mas de lá, só chega uma leve brisa de ar frio que carrega o silêncio mais amargo que alguma vez consegui provar. Eles aproximam-se cada vez mais, carregados com as armas mais agressivas e dolorosas e eu sem nada para me defender. As creaturas que eu julgava ter fechado na caixa que o Anjo branco me entregara, tinham-se soltado e estavam mais do que nunca revoltadas e dispostas a devastar-me os sentimentos com uma só facada. A minha mente escureçe a cada pegada mais próxima que eles dão na minha direcção.. mas, eis que, surge uma fenda no meio daquela enorme muralha de creaturas.. Deparei-me com um ser normal, não idêntico a nenhum daqueles monstros.. É o líder.. Sou eu.. Ainda faz frio cá fora.. e só as tochas que eles carregam com eles para iluminar esta escuridão aqueçe o meu rosto. Num último suspiro, desvio o olhar do batalhão liderado por mim mesmo, procuro e grito desesperadamente com medo nas duas direcções, nos dois caminhos, entrego socos violentos nas duas portas das quais eu perdera as chaves. O meu corpo, começa a tremer , não há resposta.. não há reacção, não há.. Nada. É aí que vou de encontro ao meu olhar, o meu eu, faz sinal.. Os monstros, os demónios, todas a creaturas que eu criei começam a correr na minha direcção com gargalhadas malvadas e olhares horrendos.. Nesse instante, baixo a cabeça e simplesmente fecho os olhos..
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